A luta contra a crise climática tem inspirado uma série de ideias ambiciosas, incluindo algumas que parecem ter saído diretamente da ficção científica. De tecnologias que capturam dióxido de carbono diretamente do ar até propostas radicais de geoengenharia, nada parece fora de alcance na corrida para resfriar nosso planeta em chamas. E com razão: as crises climática e de biodiversidade afetam de forma mais severa os países mais pobres, e a ação urgente é indispensável.
Mas e se a resposta para a mudança climática fosse tão simples e atemporal quanto a própria natureza? Essa é a filosofia por trás das soluções baseadas na natureza. Quando bem apoiadas, elas podem ser a chave para estabilizar o clima, ao mesmo tempo em que enfrentam desafios socioeconômicos como segurança alimentar e prevenção de pandemias.
Por isso, apoiá-las é parte fundamental da defesa do planeta. Vamos entender melhor esse conceito para identificar as soluções que realmente funcionam para proteger as pessoas e o meio ambiente. Afinal, o que são soluções baseadas na natureza e como podemos liberar todo o seu potencial?
Vamos Começar pelo Básico: O Que São, Afinal, Soluções Baseadas na Natureza?
De forma simples, uma solução baseada na natureza é um projeto que atua em harmonia com as forças naturais de um ecossistema para fortalecê-lo, gerando efeitos positivos tanto para as pessoas quanto para o clima. Quando bem-sucedidas, essas iniciativas protegem, gerenciam e restauram o meio ambiente. Apesar de poderem assumir diferentes formas, todas compartilham um princípio central: ao trabalharmos com a Terra, e não contra ela, podemos construir um mundo mais resiliente e sustentável. É por isso que a Global Citizen está convocando um investimento de US$1 bilhão de dólares para proteger e restaurar a Amazônia, incluindo o apoio a soluções baseadas na natureza lideradas por povos indígenas da região.
Projetos que se concentram apenas em reduzir o impacto humano, como reciclagem ou economia de água, não são considerados soluções baseadas na natureza. Esse tipo de abordagem requer uma ação mais proativa e holística para fortalecer ecossistemas saudáveis, como a conservação de áreas naturais ou a restauração de habitats da vida selvagem.
Por que tanto se fala sobre Soluções Baseadas na Natureza agora?
A verdade é que as soluções baseadas na natureza não são novidade. Povos indígenas vêm protegendo os ecossistemas da Terra há séculos com métodos de conservação que trabalham em harmonia com a natureza. Hoje, eles são responsáveis por preservar 80% da biodiversidade do planeta. Agora, cada vez mais países estão incorporando essas soluções em suas metas nacionais de clima, biodiversidade e restauração.
As soluções baseadas na natureza vêm ganhando força tanto no setor público quanto no privado. As empresas perceberam que integrá-las às suas cadeias de produção oferece vantagens não só ambientais e econômicas, mas também reputacionais. Isso é fundamental, já que o investimento privado será essencial para cobrir o déficit de financiamento climático.
Você pode dar alguns exemplos de soluções baseadas na natureza?
Aqui vão algumas das soluções inspiradoras que amamos:
Trazendo a Natureza para as Cidades
Criar áreas verdes urbanas ajuda a reduzir o impacto de ondas de calor e melhora a qualidade do ar, algo essencial em um mundo cada vez mais urbano, onde cerca de 4,2 milhões de mortes prematuras por ano são atribuídas à poluição do ar. Megacidades estão apostando em projetos de infraestrutura verde, como a iniciativa de Mumbai para criar uma floresta urbana de 3,2 acres, ajudando a mitigar o efeito de ilha de calor. Esses espaços também oferecem lazer e bem-estar para os moradores.
Restaurando Zonas Úmidas Costeiras
As zonas úmidas oferecem múltiplos serviços ambientais, como proteção contra enchentes e filtragem da água, gerando cerca de US$47 trilhões de dólares em benefícios econômicos por ano. Em Chennai, na Índia, a restauração de um lago e áreas alagadas aumentou a capacidade de armazenamento de água da cidade, reduziu os danos causados por inundações e melhorou a qualidade da água para a vida silvestre local.
Essas áreas também são mais econômicas: restaurar zonas úmidas pode ser de 2 a 5 vezes mais barato do que construir barreiras artificiais, como muros de contenção.
Manguezais são verdadeiras estrelas quando o assunto é impedir ressacas e capturar carbono com eficiência e baixo custo. Nas Seychelles, por exemplo, armazenam cerca de 2,5 milhões de toneladas de CO₂ (o equivalente a retirar 500 mil carros das ruas por um ano inteiro).
Embora a perda de manguezais esteja desacelerando, mais da metade desses ecossistemas ainda corre risco de colapso até 2050. Mas há motivos para esperança: em países como o Paquistão, a quantidade de manguezais vem aumentando graças a programas comunitários de reflorestamento e conservação que deram certo.
Plantando Árvores
Pode parecer simples, mas programas ambiciosos de plantio de árvores são essenciais para que as florestas do mundo continuem atuando como sumidouros de carbono. Em todo o continente africano, 11 países estão apoiando a “Grande Muralha Verde”, uma iniciativa regional para ampliar terras férteis no Sahel e combater a desertificação. A previsão é que o projeto crie 10 milhões de empregos locais até 2030. Em escala nacional, projetos como este no Burundi mostram resultados concretos: terraços arborizados em colinas íngremes reduzem a erosão do solo, minimizam deslizamentos e ainda aumentam o armazenamento de carbono e a produtividade agrícola local.
Existem desvantagens?
Como qualquer intervenção, as soluções baseadas na natureza precisam ser planejadas com cuidado para evitar impactos negativos não intencionais. Pesquisadores e ativistas alertam sobre o risco de greenwashing - quando organizações exageram os benefícios dessas soluções sem monitorar de fato seus impactos reais.
Por exemplo, sem planejamento adequado, programas de plantio em larga escala podem prejudicar ecossistemas nativos e comunidades locais. Foi o que ocorreu na Somalilândia, onde algarobeiras de crescimento rápido e resistentes à seca, originárias da América Central, foram introduzidas nos anos 1980 para combater o desmatamento. O programa teve sucesso… até demais: a espécie exótica superou a vegetação local, se espalhou rapidamente e esgotou fontes de água por todo o país. Agora, a Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO) e outras entidades trabalham para reverter os danos, ajudando comunidades locais a controlar essas árvores de forma mais sustentável.
Como Apoiar Melhor as Soluções Baseadas na Natureza?
Não há como frear, e muito menos reverter, o aquecimento global sem apostar nas soluções naturais para o clima. Se utilizadas em seu potencial máximo, essas soluções poderiam reduzir em até 12 gigatoneladas as emissões anuais de carbono (o equivalente a todas as emissões de usinas a carvão do mundo).
Adiar investimentos na natureza só vai reduzir sua capacidade de regeneração ao longo do tempo. Ainda assim, muitos países estão demorando a integrar essas soluções em seus planos climáticos. Ampliar rapidamente as soluções baseadas na natureza exige avaliações específicas para cada território, a fim de identificar as necessidades das comunidades e garantir o protagonismo de povos locais e indígenas no planejamento e na implementação.
Também é preciso mais financiamento. Em geral, políticas públicas priorizam projetos de engenharia intensivos em recursos. Em 2022, menos de 10% dos fundos globais de adaptação climática destinados aos países menos desenvolvidos foram aplicados em soluções baseadas na natureza.
A boa notícia? A natureza é resiliente. Já vimos que, quando se tem espaço para se recuperar, o processo de regeneração pode reverter os danos causados pela poluição e pelas atividades humanas. Mas os governos precisam agir agora e priorizar o que é melhor para o planeta, incentivando investimentos em soluções naturais antes que seja tarde demais.