Feche os olhos e respire fundo. Você não está no seu ambiente habitual. O ar aqui é quente, carregado de uma umidade que suavemente umedece sua pele e bagunça seus cabelos. Dá para sentir o cheiro da terra molhada, do doce tropical e de algo fresco - levemente medicinal - que você não consegue identificar de imediato. Enquanto se acostuma a esse novo ambiente, preste atenção no que você ouve.
Xiii... Se você ouvir com atenção, pode perceber o ambiente falando com você por meio de sons que se sobrepõem em harmonia. É o farfalhar das folhas respondendo ao vento, o burburinho dos pássaros se cumprimentando ao amanhecer, os gritos e uivos dos macacos brincando nos galhos acima de você, e o som grave da água correndo em algum ponto da floresta. Abra os olhos. Você, caro amigo, está na Floresta Amazônica.
Bem, uma parte muito pequena dela - e há um motivo para isso: capturar toda a grandiosidade desta maravilha natural não é tarefa simples. Ainda assim, dois artistas brasileiros - o compositor Leandro Albuquerque e a bailarina Ingrid Silva - uniram forças para fazer exatamente isso, em uma performance emocionante durante o encontro anual de lideranças promovido pelo Global Citizen, o GC Now, realizado em abril de 2025, em Nova Iorque.
A Amazônia em forma de música
Ingrid Silva se apresenta no Global Citizen NOW, no Spring Studios, em 30 de abril de 2025, em Nova Iorque.
“Transmitir toda a riqueza da Amazônia em apenas dois minutos é um desafio”, explica Albuquerque. “Mas meu foco foi capturar a emoção e a diversidade dos ecossistemas. Trabalhei com a ideia de atravessar a floresta, com o canto dos pássaros, os rios e as águas. À medida que a composição se desenrola, há harmonia e intensidade - uma intensidade que reflete as ameaças ambientais; e, a partir disso, a esperança de serenidade.”
Tears of the Green (em tradução livre, “Lágrimas da Floresta”) é uma composição original criada especialmente para a apresentação de balé de Ingrid Silva no GC Now, evento em que a Global Citizen anunciou que levará seu festival de música ao Brasil - com artistas como Anitta, Gaby Amarantos e Seu Jorge - em um chamado à proteção da Amazônia frente à crise climática.
Este tributo à Amazônia começa como uma narrativa do entardecer ao amanhecer. A música desperta suavemente e cresce de forma constante para contar a história do ambiente e de seus habitantes. No auge do crescendo, sentimos a intensidade mencionada por Albuquerque, até que, pouco depois, a composição repousa em uma serena sensação de harmonia.
“Quando ouvi a composição do Leandro pela primeira vez, fiquei arrepiada”, conta Ingrid Silva para a Global Citizen. “Foi um daqueles momentos em que tudo simplesmente se encaixa. Ele não apenas seguiu o briefing - ele sentiu. A música transmitia exatamente a emoção que queríamos passar e deu alma ao projeto. Foi algo poderoso e, sinceramente, me senti muito orgulhosa de fazer parte de algo tão cuidadosamente criado.”
Hora de agir
A crise climática provocada pelo homem vem atacando a Floresta Amazônica há décadas. O desmatamento, a poluição e a exploração de combustíveis fósseis têm sido responsáveis pela destruição de vastas áreas da floresta e pelo deslocamento de centenas de comunidades indígenas que a chamam de lar. Se continuarmos nesse ritmo, a Amazônia pode desaparecer. E, ao perdermos a maior floresta tropical do mundo, perdemos também a essência da vida como conhecemos.
A Amazônia, que se estende por nove países da América do Sul, é essencial para a regulação do clima - desde a geração de chuvas na região até a absorção de toneladas de emissões de carbono que aquecem o planeta. A perda desse recurso vital, causada pela ação humana, não pode ser subestimada.
O cenário é alarmante, mas ainda há esperança - desde que haja união e ação. Essa é a principal mensagem de Tears of the Green e da performance de Ingrid Silva.
“Acredito que a Amazônia precisa de uma voz”, afirma Leandro Albuquerque. “Na verdade, precisa da voz de todos. O que acontece na Amazônia afeta o mundo inteiro. É preciso conscientizar, denunciar e agir.”
O processo criativo
Tanto Albuquerque quanto Silva deixaram que a Amazônia os guiasse durante o processo criativo dessa performance, e ficou claro que a floresta tinha muito a dizer.
Sobre a coreografia, Silva explica: “Deixei-me guiar pela sensação de liberdade. Pensei no que a Amazônia representa para mim - sua força, beleza e espírito indomável. Cada movimento nasceu desse lugar. Não racionalizei demais; apenas deixei meu corpo responder à música e à emoção por trás dela. Foi uma conexão profunda, um exercício de confiar nos meus instintos e permitir que a história fluísse através de mim.”
Albuquerque também utilizou instrumentos específicos na composição, como forma de representar aqueles que chamam a Amazônia de lar. Além de terem origem nos povos indígenas da região, esses instrumentos são construídos para imitar sons de animais e outras formas de vida da floresta.
“Usei instrumentos como a cuíca, um tambor de fricção com um tom agudo que imita sons de animais, como o canto de aves ou o chamado de macacos”, explica Albuquerque. “Outro instrumento específico que utilizei foi o berimbau, uma percussão de uma corda só usada na Capoeira, que reflete a tensão da vida na Amazônia.”
Ele continua: “Não vejo esses instrumentos apenas como música - eles são, na verdade, recipientes que carregam as raízes da história. São mais do que sons, há uma imensidão dentro desses instrumentos que vêm sendo usados há gerações.”
Tudo isso culminou em uma colaboração arrebatadora de música, dança e imagens que deu vida à urgência de defender a floresta - e o planeta que ela sustenta.
Você pode ouvir a música de Leandro Albuquerque na Apple Music e no Spotify.