Organizações de mídia independente estão enfrentando dificuldades. Entre problemas financeiros, ataques de governos hostis e outros desafios resultantes da pandemia de COVID-19, muitos veículos de comunicação do mundo estão vivenciando uma perda severa de receita que ameaça transformar como cobrem pautas relevantes.


Com cada vez mais pessoas buscando notícias em fontes não verificadas na internet e nas redes sociais, a perda de receita só piora problemas antigos que afetam a imprensa livre, especialmente em países de baixa renda. Apenas em 2024, a Repórteres Sem Fronteiras (RSF) já documentou vários desafios enfrentados por veículos de mídia no continente africano. Na Guiné, por exemplo, líderes do governo cancelaram as licenças de funcionamento de seis emissoras independentes; de forma similar, o governo do Chade praticamente censurou veículos independentes criando obstáculos desnecessários para impedir a imprensa de cobrir as eleições nacionais em maio.

"Os veículos de mídia enfrentam pressões financeiras e outras que colocam sua existência em risco. Por exemplo, quando essas organizações são pressionadas, têm menos recursos para funcionar e podem lutar contra limitações como financiamento para salários, energia elétrica e equipamentos", afirmou Rosie Vanek, gerente de comunicação do Fundo Internacional para Mídia de Interesse Público (IFPIM), à Global Citizen. "Isso afeta sua capacidade de manter o público informado e responsabilizar o poder."

Equipe do Batumelebi no escritório em 12/7/2024, Tbilisi, Geórgia. Foco: direitos humanos e grupos vulneráveis/minoritários.
Image: Courtesy of IFPIM

O IFPIM busca abordar os desafios enfrentados pela mídia de interesse público em países de baixa e média renda. Ao direcionar financiamento para veículos em dificuldades, o fundo multilateral apoia organizações de mídia em sua busca para fornecer informações factuais, acessíveis e relevantes para suas audiências.

"A comunicação é extremamente importante para o funcionamento das sociedades", afirmou Patrik Silborn, diretor de parcerias do IFPIM, à Global Citizen. "Como enfrentaríamos mudanças climáticas, saúde pública ou outros problemas globais sem os veículos de comunicação?"


Resolver os maiores problemas sociais e de desenvolvimento do mundo começa com um público informado, especialmente quando a mídia consegue lançar luz sobre tópicos que autoridades corruptas prefeririam manter no escuro. No entanto, apenas 0,3% da assistência oficial total ao desenvolvimento mundial, ou AOD (ajuda de governos para nações em desenvolvimento), é destinada a apoiar a mídia independente.

Quando a mídia independente é enfraquecida, a própria democracia fica ameaçada. Governos hostis já perseguem jornalistas arbitrariamente e limitam a liberdade de imprensa para distrair o público de acusações de corrupção e reportagens investigativas, especialmente em países com sistemas políticos frágeis.

Segundo o Índice Mundial de Liberdade de Imprensa anual da RSF, o ambiente para o jornalismo é considerado "bom" em apenas oito dos 180 países e territórios. Para as 128 regiões do mundo consideradas na melhor das hipóteses "problemáticas" e na pior "muito graves", recursos adicionais para a mídia podem significar a diferença entre um espaço cívico funcional e uma população imobilizada.

"O financiamento pode ajudar veículos de mídia a expandir o que fazem e desenvolver novas maneiras de permanecer financeiramente viáveis no futuro", disse Vanek à Global Citizen. "Mas eles precisam de equipe e recursos para fazer esse trabalho."

Como o IFPIM apoia veículos de mídia em crise

Sabendo da falta de recursos que a mídia independente enfrenta hoje, o IFPIM mobiliza governos, setor privado e organizações filantrópicas com chamadas públicas para financiar veículos que operam em contextos frágeis. Esse apoio financeiro é feito por meio de subsídios de cerca de dois anos, dando tempo para os veículos planejarem formas de se sustentar a longo prazo.

Para doadores, o Fundo Internacional oferece uma maneira de reunir recursos que permitem às organizações de mídia de interesse público sobreviver e prosperar. Por exemplo, doadores podem estar interessados em promover representação diversa em redações ou fornecer ajuda a veículos que expõem corrupção e ajudam a garantir que eleições permaneçam livres e justas.

Mesmo quem se compromete com grandes quantias não interfere na forma como os beneficiados usam o dinheiro recebido.

"Doadores não fazem parte do nosso conselho e não têm voz em nossos processos independentes que avaliam beneficiários", disse Silborn. "Isso é para protegê-los da percepção de que estão moralizando, ou que estão exercendo influência editorial sobre a mídia em nações de baixa renda."

Enquanto várias organizações de desenvolvimento da mídia oferecem treinamentos e oficinas, a prioridade do IFPIM é fornecer financiamento de base, para que os veículos possam usar esse dinheiro conforme suas próprias necessidades. Essa característica do modelo do Fundo Internacional foi criada a partir de conversas com jornalistas que ressaltaram a urgência de cobrir custos operacionais básicos.

A Bush Radio, apoiada pelo IFPIM, é a rádio comunitária mais antiga da África do Sul, fundada na luta contra o Apartheid e transmite em 3 idiomas.
Image: Courtesy of IFPIM

A Bush Radio, rádio comunitária mais antiga da África do Sul, solicitou apoio do IFPIM em 2022 para sobreviver à crise econômica nacional. Com apagões frequentes que interrompiam transmissões em horários nobres e a queda do valor da moeda sul-africana, a Bush Radio estava ameaçada de inadimplência no pagamento do aluguel.

O apoio do IFPIM não apenas ajudou a emissora a pagar as contas e garantir que os salários da equipe sejam entregues em dia, mas também empoderou a rádio comunitária para amplificar esforços de financiamento coletivo junto ao seu público fiel.

"O IFPIM também incentiva a inovação na mídia. Como esses veículos podem alcançar novos públicos e encontrar fontes de renda alternativas?", disse Silborn. "O objetivo não é só sobreviver, mas garantir que as organizações de mídia prosperem no futuro."

Na Tunísia, por exemplo, a repressão contra a sociedade civil e os veículos de comunicação gerou um clima de medo no país progressivamente autoritário. Consequentemente, a conceituada plataforma colaborativa de blogs Nawaat passou a adotar estratégias alternativas de publicação digital para atingir uma audiência mais ampla.

O financiamento do IFPIM foi essencial para a Nawaat lançar um festival anual e apresentar suas produções jornalísticas ao público. Além disso, o veículo investiu pesado em tradução, ampliando seu alcance internacional e mantendo a tradição de jornalismo de interesse público acessível para mais pessoas.

Esse tipo de inovação é exatamente o que o IFPIM procura inspirar através de suas concessões de subsídios. Munidos de recursos para experimentar, veículos de mídia podem testar novas estratégias para combater a queda de receita e garantir sua longevidade.

“Você só consegue colocar um band-aid em um problema por um tempo”, disse Silborn. “Em algum momento, é preciso pensar em soluções para se adaptar a um mundo em constante mudança.”

Diante desse cenário em transformação, o veículo colombiano Vorágine usou o financiamento do IFPIM para planejar novas formas de receita e fortalecer seu trabalho.

O público do Vorágine já confia no veículo pelas reportagens investigativas de altíssima qualidade, que denunciam violações de direitos humanos e corrupção no governo colombiano. Agora, o veículo vai lançar uma nova iniciativa educativa, incentivando a participação cidadã e capacitando pessoas com ferramentas do jornalismo.

De acordo com o relatório anual do IFPIM, o Fundo já mobilizou US$ 52 milhões de dólares para apoiar veículos de interesse público em países de baixa e média renda. Com o aumento desse apoio nos próximos anos, o setor de mídia continuará se transformando.

"Com todos esses avanços tecnológicos, nos perguntamos: como será o futuro da mídia?", disse Silborn à Global Citizen. "Ainda não temos resposta para isso, mas sabemos que as pessoas sempre vão precisar de acesso a informações verificadas e confiáveis, seja qual for o canal."

Governos autocráticos vão continuar tentando silenciar a mídia independente, enquanto outras ameaças afetam como o jornalismo de interesse público funcionará no futuro. Para reduzir o impacto desses fatores externos e garantir notícias confiáveis para todos, Global Citizens ao redor do mundo podem agir. Pressionem líderes globais por mais financiamento para mídia de interesse público em países em desenvolvimento e apoiem o jornalismo local seguindo, compartilhando e contribuindo com veículos de sua região.

Editorial

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Por Jaxx Artz