Defensores dos direitos humanos ambientais (EHRDs, sigla em inglês) são aliados fundamentais na luta global contra as mudanças climáticas. Por meio de sua atuação em protestos pacíficos, marchas e campanhas contra práticas nocivas como o fraturamento hidráulico (fracking), esses ativistas estão empenhados em garantir que governos e empresas façam tudo o que estiver ao seu alcance para proteger o planeta.
No entanto, os EHRDs têm sido cada vez mais alvo de ataques por parte dos maiores responsáveis pela crise climática - governos e corporações.
Desde 2012, estima-se que 1.910 defensores ambientais foram assassinados. Segundo a Aliança para Defensores da Terra, Povos Indígenas e Meio Ambiente (ALLIED), esse número é apenas a ponta do iceberg diante das diversas ameaças enfrentadas por esses ativistas. Eles lidam diariamente com ameaças de morte, prisões injustas, processos judiciais abusivos (como as chamadas ações estratégicas contra a participação pública, ou SLAPPs) e o fechamento de espaços cívicos. Governos e empresas recorrem à intimidação para silenciar a defesa do meio ambiente - e os povos indígenas, em especial, enfrentam criminalização desproporcional por seu papel de liderança no movimento ambiental.
Desde o Acordo de Paris, em 2015, os governos têm concentrado esforços em avançar com compromissos de ação climática, com mais países investindo em projetos de energia renovável e estabelecendo metas de emissões líquidas zero. No entanto, ainda existe uma lacuna significativa na inclusão de defensores ambientais nesses processos de decisão, bem como na adoção de políticas climáticas que reconheçam e protejam tanto esses ativistas quanto às necessidades de suas comunidades. Com os planos atuais para limitar o aquecimento global a 1,5°C ficando aquém do necessário, os líderes mundiais precisam, agora mais do que nunca, do conhecimento e da atuação dos defensores dos direitos humanos ambientais (EHRDs), justamente os mais impactados pela crise climática e que podem oferecer contribuições valiosas na busca por soluções efetivas e sustentáveis.
Para enfrentar essa lacuna, uma nova iniciativa está sendo criada por defensores, organizações da sociedade civil e governos, com o objetivo de garantir que os defensores dos direitos humanos ambientais (EHRDs) sejam reconhecidos como atores fundamentais nas discussões multilaterais sobre clima e meio ambiente.
“Unidos, precisamos enfrentar o desafio de reinventar nosso futuro. A colaboração estratégica não é apenas essencial para construir um novo mundo, mas também para lutar por justiça e defender os direitos de todos,” afirmou Juan David Amaya, ativista colombiano e cofundador da organização Life of Pachamama. “Estamos forjando novas ideias e transformando nossa realidade em algo mais justo e equitativo. É nossa responsabilidade coletiva impulsionar a mudança que garanta um planeta mais resiliente, onde cada ser humano tenha a oportunidade de prosperar em harmonia com a natureza e com os outros. O momento de agir é agora.”
“Este é um trabalho urgente, não apenas porque precisamos acabar com toda e qualquer violência contra os defensores dos direitos humanos ambientais (EHRDs),” disse Gabriella Bianchini, coordenadora de projetos de justiça climática da Global Witness, à Global Citizen. “Queremos criar um espaço onde todos os envolvidos reconheçam o papel dos EHRDs na emergência climática e compreendam o que a sociedade precisa fazer para protegê-los.”
Rede de Líderes para Ativistas e Defensores Ambientais (LEAD)
Esses grupos estão trabalhando para criar um diálogo multilateral por meio da Rede de Líderes para Ativistas e Defensores Ambientais (LEAD), um espaço global de confiança onde ativistas possam se reunir com representantes de governos para planejar como avançar na proteção dos defensores ambientais e fortalecer oportunidades de participação nas discussões multilaterais sobre o clima. O objetivo final é que esse diálogo promova boas práticas, incentive ações conjuntas e coloque as pautas dos defensores, assim como suas recomendações, no centro das convenções e compromissos internacionais da agenda climática.
“Queremos destacar que os defensores dos direitos humanos ambientais (EHRDs) não estão apenas sofrendo os efeitos das mudanças climáticas, e a violência promovida por aqueles que perpetuam essa crise, mas também são parte essencial das soluções,” afirmou Katerina Hadzi-Miceva Evans, diretora executiva do Centro Europeu de Direito para Organizações Sem Fins Lucrativos (European Center for Not-for-Profit Law), em entrevista à Global Citizen. “Para isso, precisamos reunir grupos diversos em um mesmo espaço, mostrando a humanidade e o compromisso coletivo na luta contra a crise climática.”
A iniciativa espera ser estruturada e lançada até a Conferência das Nações Unidas sobre Mudança Climáticas no Brasil (COP30), em 2025.
“Defensores lutam arriscando suas vidas e liberdade, às vezes chegando perto da morte, enfrentando riscos extremos pelo futuro coletivo de todos nós,” afirma Olivier Ndoole, cofundador da Alerte Congolaise pour l’Environnement et les Droits de l’Homme. “Essa iniciativa contribuirá para soluções justas e sustentáveis diante da emergência climática, ao conectar a luta pelo objetivo aos próprios atores dessa luta. A iniciativa LEAD nos dá esperança de que o futuro próximo seja mais justo para os defensores ambientais em todo o mundo, ao garantir que eles tenham um lugar à mesa nas discussões climáticas e ambientais que mais os afetam.”
Ameaças Contínuas aos Defensores dos Direitos Humanos Ambientais
Membros da sociedade civil têm reconhecido, há décadas, uma lacuna na proteção dos direitos humanos, assim como na implementação de compromissos e obrigações, nos espaços climáticos e ambientais. Em resposta, impulsionaram soluções inovadoras como a Convenção de Aarhus, em 1998, e o Acordo de Escazú, em 2018, com o objetivo de garantir o acesso à informação, a participação pública e proteger os defensores dos direitos humanos ambientais (EHRDs) no exercício desses direitos.
Embora esses tratados tenham representado passos importantes na proteção dos direitos humanos dos defensores ambientais, os grupos ligados à iniciativa LEAD apontam que eles estão desconectados da realidade vivida por esses defensores diante dos governos nacionais. Mesmo com os acordos mencionados, e com compromissos assumidos em níveis internacional e nacional para proteger os EHRDs, esses ativistas continuam sendo excluídos das discussões, perseguidos e assassinados por sua atuação, e os compromissos firmados nesses instrumentos não estão sendo implementados na prática.
Por exemplo, o recente Public Order Act do Reino Unido foi aplicado no ano passado para deter ativistas climáticos que participaram de protestos. Em um informativo publicado pelo próprio governo britânico, manifestações organizadas por grupos como Just Stop Oil e Insulate Britain são citadas como justificativas para a medida. A implementação do Public Order Act ocorreu ao mesmo tempo em que o Reino Unido anunciou compromissos para financiar iniciativas sustentáveis em países em desenvolvimento, substituir os combustíveis fósseis e atingir emissões líquidas zero no setor público até 2050.
Mesmo quando os governos consultam a sociedade civil sobre seus esforços no combate às mudanças climáticas, a falta de respeito por ativistas de base e lideranças locais acaba limitando o espaço cívico. Um exemplo claro disso foi a restrição à atuação dos defensores dos direitos humanos ambientais durante a COP28, em Dubai, onde a capacidade de se reunir e protestar pacificamente foi comprometida por limitações impostas pelo governo e diretrizes arbitrárias sobre manifestações.
Essas contradições evidentes por parte de governos que, ao mesmo tempo em que apoiam avanços climáticos, reprimem defensores ambientais, revelam uma falta de compreensão sobre a conexão entre ação climática e a atuação dos defensores, o que acaba resultando em mais ataques, assédio e criminalização desses ativistas.
Como a LEAD Pretende Impulsionar Mudanças nos Espaços Multilaterais de Clima e Meio Ambiente
A LEAD busca explicar e demonstrar com mais clareza a conexão essencial entre os defensores dos direitos humanos ambientais e as soluções climáticas sustentáveis - não apenas para proteger esses ativistas contra violações, mas também para garantir que as soluções para a crise climática sejam fundamentadas nos direitos humanos e lideradas pelos próprios defensores.
Os responsáveis pela iniciativa LEAD estão buscando ativamente o apoio de governos, o que facilitará a participação formal dos defensores dos direitos humanos ambientais junto a líderes mundiais nesses espaços multilaterais. Eles também estão dialogando com outros atores, incluindo ativistas de base e grandes organizações da sociedade civil, sobre como a iniciativa pode contribuir para garantir a participação e a proteção desses defensores nas discussões climáticas, para que finalmente possam estar no centro dessas conversas.
“Estamos percebendo que, quando diferentes grupos se reúnem, o véu da negatividade se desfaz e surge uma oportunidade,” disse Hadzi-Miceva Evans à Global Citizen. “Em um espaço multilateral e com múltiplas partes envolvidas, conseguimos superar diferenças e construir uma rede de respostas progressistas à emergência climática, com os defensores no centro dessa ação.”
Claro, em seus esforços para criar um espaço seguro e colaborativo, a LEAD está levando em conta como os defensores dos direitos humanos ambientais - muitos dos quais já enfrentaram intensas perseguições - podem se sentir à vontade para colaborar com governos.
Antes de seu lançamento no próximo ano, a LEAD está concentrando esforços em conquistar o apoio dos governos da Colômbia e do Brasil, que sediarão, respectivamente, a COP16 da Convenção da ONU sobre Biodiversidade, em 2024, e a COP30 da UNFCCC, em 2025.
“É crucial que nós, defensores ambientais, tenhamos participação ativa e significativa em todos os processos de tomada de decisão relacionados ao clima", afirma Claudelice dos Santos, defensora ambiental do Pará, no Brasil, e coordenadora do Instituto Zé Cláudio e Maria. “Precisamos de apoio total da sociedade civil, da mídia, do governo e de outros setores para construir um espaço internacional onde o diálogo entre diferentes atores seja possível, promovendo o reconhecimento, a proteção e a participação dos defensores ambientais no contexto das mudanças climáticas. Sem nossa presença nas mesas de discussão, não haverá justiça climática nem transição energética justa.”
Para ampliar o impacto da iniciativa LEAD antes desses marcos importantes, Global Citizens de todo o mundo podem agir agora em apoio aos defensores dos direitos humanos ambientais.
Informe seu governo sobre a importância de garantir a presença e a voz dos defensores nos espaços multilaterais de clima e meio ambiente. Reconheça que a participação desses defensores não é apenas essencial para sua própria proteção, mas também para oferecer ao mundo as soluções urgentes de que precisamos para enfrentar as mudanças climáticas e a degradação ambiental. Além disso, continue agindo com a Global Citizen para defender um espaço cívico aberto, onde todas as pessoas possam participar ativamente e expressar suas opiniões sem medo de perseguição.